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Ἀπολογία Σωκράτους (Apologia de Sócrates), Platão

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2023-07-12T18:04:19

A vida não examinada não merece ser vivida.

Um dos diálogos platônicos que retrata os últimos dias de Sócrates (junto com Euthyphro, Crito, Phaedo, e a Apologia de Xenophon). Tendo sido acusado de "corromper a juventude" e ensinar aos homens que "não aceitem os deuses que a cidade aceita", e sabendo qual é seu destino, o filósofo consulta seu δαιμόνιον (daimonion, sua "faculdade divina") e decide que, ao invés de desistir e escapar de seu julgamento, como os promotores desejariam que fizesse, ele apresentará sua defesa em frente à corte e encarará a consequência suprema.

Esse pode ser considerado o diálogo socrático quintessencial: contém muitos dos elementos idiossincráticos pelos quais ele é mais renomado. Sua maneira tradicional de falar (a epônima ironia socrática) é presente desde a abertura e tornada quase mítica no famoso relato do pronunciamento pelo oráculo de Delphi que ele era o homem mais sábio. Isso ele descobre ser não pelo que sabe ("pois sei que não tenho sabedoria, pequena ou grande"), mas porque a consciência da sua ignorância assegura a sua humildade, e a sua subsequente busca e examinação de homens verdadeiramente sábios para que ela pudesse ser refutada leva à descoberta que nenhum era de fato sábio, somente pensava ser.

Alguns séculos depois, Cícero escreveria que em seu julgamento Sócrates falou ut non supplex aut reus, sed magister, aut dominus videretur esse iudicum ("a ser visto não suplicante como réu, mas como mestre, senhor de seus juízes"). Ele é a personificação do homem livre, no sentido clássico (e verdadeiro): libertado de vícios mundanos, sua vida é dedicada, até o fim, ao que é verdadeiramente importante, a virtude. Na força de sua convicção, integridade, e retidão, nem mesmo a morte é uma ameaça: temor a ela é "pretensão de sabedoria". Nada o ferirá: seus acusadores e juízes não tem poder, "pois a um homem ruim não é permitido ferir alguém melhor que ele", e "nenhum mal pode acontecer a um homem bom, na vida ou após a morte".

E agora parto portanto condenado por vocês a sofrer a pena de morte — eles também seguem seus caminhos condenados pela verdade a sofrerem a pena da vilania e injúria.

A fonte de sua fortitude é a devoção obstinada, pois seu dever é eminentemente religioso: "eu obedecerei a Deus, e não a vocês". Similar é a sua inferência do augúrio de Pythia: "mas a verdade é, ó homens de Atenas, que somente Deus é sábio". E sua preocupação moral não é só consigo, mas com as almas de seus concidadãos, e mesmo de seus acusadores: ele argumenta não por sua causa, "mas pela sua, para que não pequem contra Deus me condenando". E como "Deus me ordena a cumprir a missão do filósofo de inquirir a mim mesmo e a outros homens", trair esse mandamento seria não só imoral, mas ímpio:

Nunca alterarei meu modo, nem que tenha que morrer várias vezes.


Preferiria morrer tendo falado da minha maneira, a falar da sua maneira e viver.


Um homem que é bom para qualquer coisa deve somente considerar se ao fazer algo faz o certo ou o errado[…]; não deve pensar na morte ou em qualquer coisa senão na desgraça.


Porque se, ó homens de Atenas, por força de persuasão e súplica eu pudesse compelir seus juramentos, então estaria os ensinando a acreditar que não existem deuses, e em defesa simplesmente me condenaria à acusação de não acreditar neles. Mas não é assim — muito pelo contrário. Porque eu acredito que existem deuses, num sentido superior ao que os meus acusadores acreditam.

Sócrates foi julgado e executado na Atenas do século IV A.C., mas num tempo em que o tribunal da opinão pública ainda coage e silencia, em que a morte é evitada a qualquer custo, em que se pensa que liberdade é licenciosidade, incontinência, isenção de consequência, e subordinação a nada e a ninguém, num tempo de insignificância, relativismo moral, e confusão, a sua apologia mostra que existem coisas para as quais vale a pena viver — e morrer: sabedoria, verdade, e o maior aperfeiçoamento da alma.

É chegada a hora da partida, e seguimos nossos caminhos — eu para morrer, vocês para viverem. Qual é melhor, só Deus sabe.

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